segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014


 
Libanio: amor apaixonado

Na noite desse 31/01/2014, aconteceu, no auditório da FAJE, o Ofício da Noite, na vigília junto ao corpo do Pe. Libanio e, em seguida, um longo, emocionado e belo “Testemunho dos Amigos”, desde companheiros jesuítas de longa data, como o Pe. MacDowell, até pessoas anônimas da comunidade. Mensagens vindas de outras cidades e países também foram lidas. O jornalista Chico Pinheiro enviou belíssimo depoimento http://www.ihu.unisinos.br/noticias/527834-joao-batista-libanio-1933-2014-homenagem-de-chico-pinheiro - sobre o papel do Libanio na formação da juventude da sua geração, aqui em BH. A presidente Dilma, que também conheceu Libanio, na sua juventude, também mandou uma mensagem à família. Coube a um primo do Libanio falar em nome da família. Um primo mais que especial: Frei Betto. Contou que, para os familiares, Libanio era o João, o tio João de muitos sobrinhos.
Frei Betto disse que não gostava da palavra ‘morte’. Ela não dá conta de expressar a realidade que se manifesta quando a vida parece ter chegado ao fim. Parece... Ele usou a expressão transvivamento, passar para outra dimensão da vida.
Gosto, também do que disse Guimarães Rosa: “A gente não morre, fica encantado”.
Nada mais adequado ao Libanio, ou ao tio João, que nos encantou a todos e a tantos, ao longo da vida.
Diante do caixão, fiquei pensando: cheguei a uma idade em que, quando me dizem que alguém morreu, por exemplo, com 75 anos, respondo na hora: novo, não? Tem sido assim de uns tempos pra cá; tenho achado que todo mundo está morrendo novo demais. Taí outra expressão perfeita para o Libanio: morreu novo demais, na juventude dos seus 81 anos.
Depois, fiquei ouvindo os depoimentos, as conversas entre as pessoas, mergulhando nesse clima que vai se estabelecendo quando o velório adentra as horas da noite, da madrugada.
É engraçado, até quando morre um canalha (e canalhas morrem apesar de alguns, talvez por terem vestido o fardão da Academia, se julgarem imortais), as pessoas no velório naturalmente dirigem a conversa na direção de buscar a bondade possível que ficou daquela vida. É compreensível.
Aprendi com o Libanio que Deus, que É amor, criou a cada um de nós POR amor e PARA o amor.  O amor é nosso berço, caminho e destino. É o que dá sentido à nossa existência. Então, é natural que, ao fim de uma vida, se busque justificar com a lembrança da bondade exercitada pelo falecido, o sentido dessa vida, agora, pronta para a plenitude.
A bondade original do Libanio, na memória agradecida de tantos, fluía, transbordava das conversas, assim como a Criação transborda, todos os dias, do coração de um Deus que é amor e se derrama por inteiro nas suas criaturas.
Em Jesus, Libanio aprendeu, viveu e ensinou, Deus se revela definitivamente e amorosamente, ‘apaixonado’. Nele, o amor diviniza a humanidade e a paixão humaniza a divindade. E se somos ‘imagem e semelhança deste Deus’, não amamos e nos apaixonamos por altruísmo, porque é poético, romântico e prazeroso. Amamos e nos apaixonamos porque somos divinos e humanos.
            Tudo o que fazemos e vivemos, das escolhas mais fundamentais ao mais banal dos gestos cotidianos, traz consigo a possibilidade amorosa e apaixonada. É nossa vocação. Fazer escolhas, abraçar ideais, por amor e com paixão. É da nossa gênese. Está no nosso DNA espiritual e eterno.
            Libanio foi uma pessoa assim, amorosa. Pessoas assim são naturalmente apaixonantes. Elas contagiam e atraem tudo em si e à sua volta. São pessoas “amáveis” e, acrescento, “apaixonáveis”. É impossível não amá-las, não querer estar ao lado delas, a não ser que o egoísmo tenha bloqueado todas as nossas sinapses afetivas.
            Elas sinalizam a verdade da síntese que Jesus fez dos mandamentos: “amar a Deus com todo o seu coração, com toda a sua alma, com todo o seu entendimento e com toda a sua força, e ao próximo como a si mesmo” (Marcos 12, 30).
            Pronto, taí a definição do amor apaixonado que Libanio viveu e compartilhou. Amou com todo o seu coração, com toda a sua alma, com todo o seu entendimento e com toda a sua força. Amou com toda a sua alegria e liberdade. Amou com seu corpo e seus sentidos. Entregou-se inteiro e apaixonadamente ao amor, Partilhando o SER e o TER, em tudo, amando e servindo, como rezou e viveu seu pai Inácio.
            Aprendi com o Libanio; é assim que Deus é.
            É assim que Ele nos convida a ser. 

Eduardo Machado

01/02/2014

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